Por Letícia Rocha – Integrante de Católicas pelo Direito de Decidir

Celebrar o Dia da Consciência Negra é um chamado a toda população brasileira a voltar-se para a história, a cultura, os saberes e conhecimentos dos povos negros que construíram esse país com sangue, suor e dor. Consciência negra é a sensibilidade do nosso povo negro à sua história, ancestralidade e herança cultural. Nos remete a refletir sobre a nossa história e a importância dessa para a construção social, cultural e religiosa do Brasil. Consciência negra é fazer memória da força e do sofrimento daqueles e daquelas que nos precederam na história desse país, desde os inícios da colonização até o decreto da abolição, que apesar de ter como premissa a liberdade e a igualdade, efetivamente não concedeu nem um nem outro. As/os negras/os seguiram sendo escravizadas/os pelo sistema dominante atual e, experimentando em seus corpos as desigualdades advindas dele, que os relega à marginalidade e à negação de direitos como sujeitos.

No Brasil, 54% do povo se denomina preta, segundo dados do IBGE. Ou seja, metade da população, o que permite considerar o país com o maior número de negros fora do continente africano. Contudo, tal fato não significa que haja reconhecimento, entendimento, sensibilidade e harmonia na sociedade no tocante às questões raciais. Pelo contrário, o que existe é uma disparidade e assimetria social, que coloca a população negra no país em uma de situação marginalidade, o que impede o acesso ao estudo, ao trabalho, ao lazer, à saúde, à justiça reprodutiva, dentre outros. Estes impedimentos mencionados denotam que, no cerne da sociedade brasileira, ainda há vestígios coloniais e escravistas no imaginário da população. Por isso, segue sendo necessário lutar, resistir e apostar numa educação antirracista que abarque todas as fases da vida, que perpasse as instituições educacionais, os movimentos e coletivos sociais, o movimento feminista em sua ampla diversidade, as políticas públicas, enfim, que atravesse a história de vida de todo o povo brasileiro

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Católicas pelo Direito de Decidir em seu compromisso com a vida humana, e especialmente o direito de decidir de cada mulher, assume a luta antirracista como parte de seu campo de atuação. Partindo de um recorte racial, reconhece que são as mulheres negras as maiores vítimas dos descasos envolvendo políticas públicas e de inclusão social. Somada a essa questão, deve-se reconhecer que, com a pandemia da Covid-19, se escancarou e aprofundou não somente as desigualdades sociais, como também as desigualdades raciais. Nesse período constata-se um maior número de mortes maternas em decorrência do vírus, o fechamento dos serviços de aborto legal e a diminuição dos serviços de saúde reprodutiva de maneira geral. Foram os corpos enegrecidos e periféricos que mais sofreram com a violência doméstica e a culminância deste, que é o feminicídio. Segundo dados do IPEA, de 2015, o Brasil tem a maior população doméstica do mundo. O trabalho doméstico é uma profissão que, apesar de ter ganhado um significativo reconhecimento a partir da implementação das últimas legislações, ainda assim, traz resquícios atualizados do período escravocrata, pois é majoritariamente exercido por mulheres negras.

Nesse dia rememoramos a vida e a luta de Zumbi dos Palmares e da sua companheira Dandara. Zumbi e Dandara representam a luta e a consciência negra. Nos unimos a todas as pessoas que lutaram e seguem lutando e resistindo por uma sociedade igualitária e sem racismo.