Como amplamente noticiado pela mídia, o Papa Francisco realiza nestes dias uma visita ao México. Diante da epidemia trazida pelo vírus Zika e a possibilidade de que as mulheres gestem crianças com microcefalia, Católicas pelo Direito de Decidir dos Estados Unidos lançou um apelo ao chefe da Igreja Católica, para que esta compreenda a situação e respeite a decisão daquelas mulheres católicas que decidam abortar. O apelo, publicado no The New York Times e no Diário de Hoy El Salvador estende-se ainda à aceitação pela hierarquia católica do uso de contraceptivos. Referindo as situações de El Salvador e da Nicarágua, em que o aborto é totalmente proibido e a disseminação dos casos de microcefalia no Brasil, o texto invoca a parábola do Bom Samaritano, pedindo ao Papa que exerça uma autêntica liderança pastoral.
Leia a íntegra da carta*:
Papa Francisco, nestes dias de sua viagem ao México, lhe pedimos que esclareça a seus irmãos Bispos que as mulheres católicas podem seguir sua própria consciência e usar métodos anticoncepcionais para proteger-se e também a seus companheiros. Pedimos que esclareça à hierarquia católica que as decisões das mulheres sobre gravidez, incluindo a possibilidade de decidir pela interrupção, são dignas de respeito e não de condenação.
“Em El Salvador, as mulheres são presas somente pela suspeita de ter abortado, enquanto a hierarquia católica continua sua cruel proibição aos métodos anticoncepcionais. É muito importante que o Papa Francisco assuma uma postura a favor das mulheres vulneráveis que neste país merecem o direito de tomar suas próprias decisões sobre a gravidez” comentou Rosa Hernández, de Católicas pelo Direito de Decidir de El Salvador, que está entre as pessoas que assinaram o anúncio colocado no El Diario de Hoy.
Esse mesmo anúncio foi publicado tanto no internacional New York Times, como no El Diario de Hoy, de El Salvador, e foi rejeitado por um jornal nicaraguense por dizer a verdade sobre o aborto nesse país.
“Há aqueles que se negam a enfrentar a realidade de que as mulheres da Nicarágua abortam e necessitam de uma atenção integral à saúde reprodutiva. As mulheres sofrem por causa da ilegalidade do aborto neste país e os meios de comunicação vinculados ao Estado não nos permitem sequer mencionar a palavra, muito menos falar dos danos que ocasionam essas restrições para as mulheres”, expressou Bertha Massiel Sánchez Miranda, de Católicas pelo Direito de Decidir da Nicarágua.
A epidemia do Zika estendeu-se a mais de 25 países de América Latina e Caribe – região natal do Papa Francisco – onde a condenação da hierarquia católicas ao aborto e aos métodos anticoncepcionais modernos exerce uma grande influência na vida política. Na América Latina e no Caribe, segundo dados do Guttmacher Institute, 97% das mulheres em idade reprodutiva vivem submetidas a leis sumamente restritivas em matéria de aborto. A Organização Mundial de Saúde prevê que no presente ano haverá até quatro milhões de casos de Zika, enfermidade transmitida pelo mosquito. Somente no Brasil, foram registrados cerca de 4 mil casos de devastadores defeitos congênitos provocados pelo vírus.
Segundo uma pesquisa internacional de pessoas católicas, realizada por Univisión em 2014, 78% dos pesquisados – e 91% das e dos católicos de América Latina – estão a favor do uso de métodos anticoncepcionais modernos.
Afirmou Jon O’Brien, presidente de Católicas nos EUA: “As pessoas católicas fiéis reconhecemos que o aborto e os métodos anticonceptivos, são parte do espectro de atenção à saúde feminina. O vírus do Zica traz à tona um tema que já alcançava proporções críticas. Agora é o momento de que Francisco demonstre a compaixão que prega, que aproveite sua viagem ao México para ser um Papa de vocação pastoral, não política”.
* Tradução de Regina Soares Jurkewicz, coordenadora de Católicas pelo Direito de Decidir do Brasil.
Versão do texto em inglês no site de Católicas dos EUA: https://www.catholicsforchoice.org/news/pr/2016/FrancisActToRespectLatinAmericanWomen.asp