Por Católicas pelo Direito de Decidir
No dia 18 de maio nos lembramos de forma especial das crianças e adolescentes. Este dia foi instituído o “Dia Nacional de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes”, através da Lei 9.970, art.1.
A escolha da data é uma lembrança a toda a sociedade brasileira sobre a menina sequestrada em 18 de maio de 1973, Araceli Cabrera Sanches, então com oito anos, quando foi drogada, espancada, estuprada e morta por membros de uma tradicional família capixaba. O silêncio de muitos acabaria por decretar a impunidade dos criminosos.
Sua morte, contudo, ainda causa indignação e revolta. O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes vem manter viva a memória nacional, reafirmando a responsabilidade da sociedade brasileira em garantir os direitos de todas as suas Aracelis.
É urgente que a sociedade civil, o governo, as igrejas, formadores de opinião, autoridades e instituições em geral tenham consciência sobre a gravidade dos atos de violência sexual que ocorrem em nosso país. Hoje particularmente, nos lembramos das crianças e adolescentes abusadas muitas vezes em suas próprias casas, por aqueles que deveriam protegê-las.
A violação sexual atinge a dignidade humana, de maneira muitas vezes irreparável. É inaceitável que tenhamos um problema dessa magnitude em nosso meio. Infelizmente as Igrejas, hospitais e colégios confessionais também se tornaram um espaço de insegurança para as crianças, e nos últimos anos cada vez mais as notícias de pedofilia vem sendo divulgadas.
Compartilhamos com vocês um breve relato de Marie L. Collins, publicado na Revista Concillium, n.3, Petrópolis, anos 2004:
“Tinha 12 anos quando fui internada num hospital infantil para submeter-me a uma cirurgia. Era uma criança feliz, bem sucedida, sociável e confiante. Nunca tivera qualquer motivo para desconfiar de um adulto e não sabia nada de sexo. Estava completamente despreparada para lidar com os abusos que estavam por vir. Pe Paulo, o jovem capelão católico do hospital, visitou-me logo após a internação. As religiosas e outros adultos o tratavam com o maior respeito. Ele me fazia companhia e passava longo tempo ouvindo-me falar da minha família e do medo que eu sentia da operação que ia sofrer. Fez-me sentir que era sua amiga especial. Confiei totalmente nele.
Quando ele começou com toques íntimos, fiquei chocada e confusa. Procurei fazer com que ele parasse, mas não podia me contrapor a seus argumentos. Ele dizia que, se eu achasse que o ‘jogo’, como ele chamava, estava errado, ‘eu não era normal’. Ele ‘era o padre e os padres não podiam fazer nada de errado’! Pode parecer errado agora, mas para uma criança daquele tempo isso soava como verdade. Quando eu continuava a protestar, ele dizia que eu “era bobinha”. Seus argumentos sempre repetidos me convenceram: Eu era estúpida e, de certa forma, pensava que o que estava acontecendo era culpa minha.
Na última semana de minha internação, Padre Paulo colocou-se ao pé da cama com uma máquina fotográfica e, sob intimidação, levou-me a deixar que ele tirasse uma foto íntima. Eu me senti degradada e humilhada. A manhã seguinte era o dia das confissões semanais. Pe Paulo postou-se aos pés da cama novamente, com um livro de orações na mão em lugar da máquina fotográfica, com a estola pendente e pose de autoridade. Eu queria confessar que me sentia tão mal mas sabia que isso ia aborrecê-lo. Isso me fez sentir pior: católica consciente, eu recebera a confirmação recentemente e sabia que fizera uma ‘má confissão’.
Quem abusou de mim tinha poder e autoridade, era um adulto e eu uma criança. Era uma situação desigual. Ele explorou minha vulnerabilidade e dependência, minha inocência. Meus pais e o hospital confiaram-me a ele na expectativa de que a prioridade dele fosse o meu bem, mas, para o Padre Paulo, a prioridade foi satisfazer suas necessidades pervertidas, usando sua condição de sacerdote para encobrir seu comportamento abusivo.
Deixei o hospital após três semanas como uma criança muito mudada. Culpada e confusa, achava que eu era uma pessoa má e não queria que ninguém descobrisse. Estava convencida de que tudo era culpa minha; algo de ruim em mim fizera com que tudo acontecesse.Só 25 anos depois de ter sofrido o abuso, falei dele pela primeira vez….”
Nós de Católicas, esperamos que o Papa Francisco, tome providências sérias para acabar com qualquer gesto de abuso sexual contra crianças e adolescentes… e que os padres abusadores, sejam julgados pela justiça civil e não protegidos pelo direito canônico.